Entre 1933 e 1989, por meio do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), o governo orientava, fomentava e controlava a produção e o preço do setor sucroalcooleiro. Em 1986, com o enfraquecimento do Proálcool, criado 11 anos antes, a maior parte dos produtores começou a tomar prejuízo por conta do controle de preços, indo inúmeros a falência.
Nos anos 2010, quando o governo Dilma Rousseff retomou o controle de preço dos combustíveis, o setor foi à Justiça para reaver o prejuízo levado pelo tabelamento entre os anos de 1985 e 1989. Em 2013, o Superior Tribunal de Justiça decidiu a favor das usinas, mas cerca de 20% delas ainda não conseguiram receber os precatórios.
A Advocacia Geral da União, então, entrou recentemente com um recurso no Supremo Tribunal Federal e ganhou o voto favorável do relator da ação, ministro Luiz Edson Fachin. No último mês de abril, o Plenário Virtual do STF suspendeu o julgamento.
Segundo a AGU, o impacto nos cofres públicos seria de cerca de R$ 70 bilhões. As usinas contestam o número. Falam em R$ 8 bilhões.
A discussão se dá em torno de pedidos de indenização de mais de 290 usinas que reclamam de prejuízos decorrentes da política de fixação de preços adotada pelo IAA.
O ministro Alexandre de Moraes pediu vista ? mais tempo para análise. E ainda não há data para o processo voltar a julgamento, que estava com três votos favoráveis ao setor e dois para a União.
O relator deu razão ao governo (leia voto abaixo) e foi acompanhado pela ministra Rosa Weber. Para Fachin, é imprescindível uma perícia técnica para comprovar prejuízo em cada caso concreto. Já os ministros Ricardo Lewandowski, Luiz Fux e Marco Aurélio Mello votaram contra o recurso da União.
Em debate na tarde desta quinta-feira na TV ConJur, pela série "Segurança na Crise", os economistas Maílson da Nóbrega (ex-ministro da Fazenda entre 1998 e 1990), Plinio Nastari (presidente da Datagro) e José Roberto Afonso (professor do IDP e doutor em Economia) discutiram o impacto da epidemia e a possível mudança na jurisprudência pelo Supremo no setor sucroalcooleiro.
"É um setor que gera mais de 2 milhões de empregos diretos, que sofre um impacto duplo, da pandemia e do preço internacional do petróleo, que teve uma forte queda, quase que inviabilizando o preço do etanol. Fora que o governo está levando em conta agora pagar só as usinas ineficientes, ao considerar o custo contábil delas. É preciso levar em conta o diferencial de preço praticado na época. Está em jogo aqui a relação econômica em todos os setores, a segurança jurídica. O Judiciário precisa promover um sistema legal crível, confiável," disse Nastari.
Para o ex-ministro Maílson da Nóbrega, a Petrobras, diferentemente dos tempos do governo Temer, não tem praticado as variações internacionais. "Estima-se que haja uma defasagem de 20% no preço da gasolina, que afeta diretamente o preço do etanol."
Segundo Afonso, o país está a um passo de mais uma longa depressão econômica, "e o passado não vai iluminar o futuro". "Mas deixá-lo incerto agora, caso a jurisprudência seja revertida pelo Supremo, seria uma catástrofe. Era o que faltava. Primeiro a insegurança econômica. Agora, a jurídica."
"O setor se engajou na palavra do governo. Da produção de 500 milhões de litros, saltou-se para 35 bilhões hoje", completa Maílson. "Não faz o menor sentido agora que o próprio governo venha causar um dano irreparável ao setor."
ARE 884.325
Clique aqui para ler o voto do relator Fachin
Clique aqui para assistar ou veja abaixo o seminário: